Prefácio
Faz exatamente vinte anos que apresentei pela primeira vez minha Teoria Positiva do Capital. Quando posteriormente se impôs a necessidade de uma nova edição de minha obra, as obrigações inerentes a um cargo cheio de compromissos me absorviam tão exaustivamente que tive de renunciar a qualquer tentativa de aperfeiçoar minha obra; assim sendo, a segunda edição teve de reduzir-se a uma reprodução totalmente inalterada da primeira. Somente esta terceira edição me dá – pela primeira vez depois de vinte longos anos – a oportunidade de empreender um reexame crítico de minha doutrina em sua estrutura global e de também responder, face a mim mesmo e face ao público, à pergunta de se e como ela tem condições de impor-se apesar da evolução progressiva e contínua da ciência.
Todo conhecedor da Ciência Econômica sabe que riqueza de evolução tem havido nessa área, precisamente nos últimos vinte anos. Em toda parte o renascimento do interesse pela pesquisa teórica tem levado uma plêiade de investigadores capacitados e ativos a se ocuparem com essa pesquisa. Ora, o que continuamente mais tem atraído a atenção foram exatamente os dois grandes problemas que constituíram o ponto de partida do mais recente movimento de renovação teórica e que haviam constituído o conteúdo quase total também da minha obra, a saber, os problemas do valor e do capital. Um número quase incalculável de livros, artigos e brochuras, escritos em todos os idiomas possíveis do mundo, têm tratado dos mesmos temas aos quais também eu dedicara minha atenção, e uma parte não pequena dessas publicações reportou-se diretamente à minha exposição. Desses autores, uns referiam-se a mim com amizade, outros com inimizade; uns reportaram-se a mim para um confronto crítico com meus pontos de vista, outros o fizeram para apoiá-los, outros, finalmente, para desenvolver ulteriormente minhas concepções, aperfeiçoando-as.
Esforcei-me, sempre dentro da possibilidade externa, no sentido de tomar conhecimento de tudo e analisar tudo, e para, dentre as centenas de estímulos e ideias construtivas e críticas contidas na enorme massa da literatura, deixar que cada uma delas, que pudesse conter qualquer conteúdo, agisse sobre meu espírito com o mínimo possível de prejulgamento. Além disso, procurei submeter à crítica minha própria posição. Procurei – o que de certo modo se me tornou mais fácil pelo fato de ter sido longo o período intermediário que passei exercendo atividades profissionais completamente diferentes da pesquisa – colocar-me como um estranho à sua própria teoria, investigando, com desconfiança fria, a fundamentação da mesma, um passo após o outro.
Depois de um intenso trabalho intelectual de cinco anos, que dediquei com exclusividade total ao reexame crítico da obra inteira, e particularmente ao reexame autocrítico, trabalho este em que acredito não ter deixado de lado nenhuma faceta de minha doutrina, apresento-a aqui ao público pela terceira vez, e, aliás também desta vez sem alterações profundas que afetem a essência da mesma. Pareceu-me que a situação exigia muitos esclarecimentos sobre minha velha doutrina, vários acréscimos de complementação e desenvolvimento, formulações melhores em vários pontos sendo, porém, relativamente pequeno o número de modificações propriamente ditas.
Em especial, não me pareceu necessária nenhuma modificação nas ideias básicas e diretrizes. Salvo engano total de minha parte, a evolução do pensamento não me leva a abandonar essas concepções fundamentais. Ao contrário, parece-me que elas já começaram a exercer influência sobre a evolução dessa parte da teoria, à guisa de um impulso eficaz, e considero pouco provável que se consiga eliminar de novo totalmente esse impulso.
Contudo, ainda que, mesmo nos detalhes, me tenha tornado mais conservador do que muitos talvez esperassem, certamente isso não se deve a uma tendência a agarrar-me obstinadamente às minhas posições. Ninguém sabe melhor do que eu quão improvável seria ter eu logo de saída encontrado a formulação mais feliz para uma ideia básica em cuja consistência talvez possa confiar, e quão improvável seria ter eu encontrado logo a simetria mais feliz que se possa imaginar para a ordenação de um conjunto tão diversificado e muitas vezes tão novo de fatos e fenômenos. Pelo contrário, estou inteiramente consciente de que muitas coisas terão de ser enunciadas de maneira mais correta, muitas coisas terão de ser ditas de modo mais claro e, sobretudo, muita coisa terá de ser formulada de maneira mais simples e com uma generalização mais feliz do que eu o fiz, e é com a máxima benevolência que acolherei todos os aperfeiçoamentos desse gênero, que certamente não deixarão de ser propostos.
Mas nem toda modificação sugerida significa necessariamente uma melhoria; e exatamente quanto menos queremos sentir-nos já definitivamente satisfeitos com o até agora atingido, tanto mais funesto e irritante seria se, embarcando precipitadamente na esteira de uma proposta, inspirada mais pelo temperamento do que pela reflexão paciente, abríssemos mão também de coisas sustentáveis e trocássemos uma concepção talvez imperfeita, mas suscetível de aprimoramento por uma concepção insustentável e errônea. Por isso, assim como tive de cuidar-me para não cair no extremo de aferrar-me com obstinação aos meus pontos de vista, exatamente na mesma intensidade tinha todos os motivos de prevenir-me contra o oposto, que não seria menos prejudicial à descoberta da verdade e, além disso, não teria ocorrido sem certo traço de comicidade; isto é, contra o perigo oposto de abandonar sem necessidade pontos de vista sustentáveis, enunciados por mim mesmo, trocando-os por propostas renovadoras que podem até ter sido menos bem fundamentadas do que aqueles meus pontos de vista anteriores.
Um exame minucioso nessa linha, pesando bem os prós e os contras, advertiu-me no sentido de precaver-me cuidadosamente contra inúmeras ideias renovadoras que surgiram. Nesse setor da reflexão teórica muitas coisas flutuam e fermentam. Com efeito, faz relativamente pouco tempo que nos dedicamos de corpo e alma à tarefa de elaborar sistematicamente todas as relações temporais, multifacetárias e complexas, de toda a nossa vida no tocante a necessidades e bens. Nesse estágio é perfeitamente natural que o fervor pioneiro e brioso dos concorrentes se adiante, lançando ideias precipitadas e brilhantes – de caráter construtivo e crítico –[…]